domingo, 29 de setembro de 2013

Tempestade




O céu carrega-se de nuvens,
E muito pesadas,
Despencam-se em raios e águas;
O dia torna-se cinzento,
O estrondo dos trovões
Formam a linha vermelha
Que rasga ao meio
O infinito que meus olhos não tocam.
As janelas de fecham,
As lâmpadas se acendem,
As sombras projetam-se, trêmulas,
Nas paredes manchadas dos quartos.
Meus olhos miram a enxurrada
Através das frestas das persianas
E a tempestade apodera-se de mim.
Fecho a última porta,
Que ainda havia entreaberta,
As águas que caem lá fora,
Molham as varandas e sacadas,
Aqui nem uma gota escorre
Pelas juntas trincadas
Dos parapeitos internos.
Aqui tudo permanece seco.
Seco e abafado.
Mas o temporal
De fagulhas e relâmpagos,
Penetra-me pelos poros da pele,
Pela íris dos olhos,
Um clarão corta-me a alma,
Da cabeça aos pés,
Lúmens chuvosos,
Como lágrimas turvas,
Fazem festa no que trago por dentro.
Regam e lavam o avesso
Do que sou e nunca vi.
Mal percebo,
O dia já clareava ao redor,
O canto eufórico dos pássaros
Anunciava que a chuva se fora,
A janela já podia se abrir,
Mas no breu impenetrável
De minhas carnes e ossos,
A trovoada arrasta-se,
Em enchentes e desabamentos,
Espíritos desabrigados,
Sangue encharcado.
E me afogo mais uma vez,
Náufrago das tempestades e redemoinhos,
Intempéries, tornados,
Agora trancados em mim.

sábado, 18 de maio de 2013

Cipó


Cipó


O que será daquela serra,
Pra onde vai o rio cipó,
Em que canto desta terra,
Vai voar gavião carijó?

Cadê tamanduá bandeira,
Ariranha, lobo guará,
Escondeu-se coruja buraqueira,
Calou-se o sabiá.

Abate o ipê amarelo,
Aqui nesta terra sem lei,
Foi-se embora o quero-quero,
E destronado urubu rei.

Vai a fauna, a flora,
Jaratataca, ouriço-caixeiro,
Vai a vida embora,
Pelos rios de dinheiro.

Fatia o Espinhaço,
Arranca a quaresmeira,
Do farto ao escasso,
Contamina a cachoeira.
  
Ah... Tem dó,
O que será daquela terra,
Nesta história que encerra,
Da motosserra do cipó.

Vão virgens águas,
Pra viajar o minério,
Vertendo turvas mágoas,
Do paraíso-cemitério.

Valentina





Valentina, Valentina,
É difícil acreditar,
Um dia foi menina,
Esta cara de assassina,
Que hoje quer me torturar.

Valentina, Valentina,
Talvez seja meu castigo,
Meu azar, minha sina,
Afundar-me na ruína
Do ataque inimigo.

Valentina, Valentina,
O fim da minha fé,
Nesta amarga toxina,
Que agora contamina
Com sorriso de mulher.

Valentina, Valentina,
Era o veneno fatal,
Aquela dose de morfina,
Retirada da latrina,
Em dose letal.

Valentina, Valentina,
E sua lâmina fria,
Na hora da chacina,
Aciona a guilhotina,
Da minha agonia.